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Judiciário adota cautela em processos de despejos coletivos

Foto: Tania Rego/Agência Brasil

Em meio à pandemia provocada pela Covid-19 e com o sistema de saúde em colapso, a Justiça tem atuado para evitar o despejo coletivo de pessoas em situação de vulnerabilidade social e econômica. Aprovada pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em fevereiro deste ano, a Recomendação 90/2021 passou a orientar que juízes e juízas tenham cautela especial na solução de conflitos que tratem de desocupação coletiva de imóveis urbanos e rurais durante a crise sanitária provocada pelo novo coronavírus.

Em poucas semanas de vigência, a medida mostra efeitos práticos. Em Santa Catarina, várias famílias que seriam removidas de suas residências na Praia de Naufragados, nas proximidades da capital, estão tentando evitar o desalojamento a partir da Recomendação 90/2021. A petição apresentada pela Defensoria Pública do estado está em análise na 3ª Vara da Fazenda Pública de Florianópolis.

O processo é assinado pela defensora Ana Paula Fischer, coordenadora do recém-criado Núcleo de Habitação, Urbanismo e Direito Agrário da Defensoria Pública de Santa Catarina. “A preocupação do CNJ veio realmente em um momento importante para sensibilizar o Judiciário. Mesmo com toda essa grande crise, a gente viu que as ordens de desocupação não pararam.”

A permanência dos despejos em meio à calamidade sanitária é, conforme Ana Paula Fischer, um fator a mais de propagação do novo coronavírus e de agravamento do colapso no sistema de saúde. “Essa recomendação é imprescindível para que essa questão seja analisada com bastante atenção pelo Judiciário para impedir esse tipo de ordem em momento tão delicado, colocando diversas famílias em situação de uma vulnerabilidade ainda maior. E acho mais importante o fato de o CNJ ter tido a sensibilidade de salientar a importância de que o Judiciário olhe com cautela especial para as pessoas em vulnerabilidade social e econômica.”

Direitos humanos

A proposta de maior cautela na análise de processos envolvendo despejos foi apresentada ao Observatório dos Direitos Humanos do CNJ em dezembro pelo presidente da Confederação Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), dom Walmor Oliveira de Azevedo. Criado em setembro de 2020, o Observatório é um órgão consultivo que fornece ao Conselho subsídios para a adoção de iniciativas direcionadas aos direitos humanos fundamentais no âmbito dos serviços judiciais.

Dom Walmor informa que, na época em que fez a sugestão ao CNJ, já havia ocorrido 79 despejos coletivos no país, com mais de nove mil famílias colocadas em situação de falta de abrigo. “Esperamos que essa iniciativa ajude a proteger a vida dos mais vulneráveis nesse difícil momento que estamos vivendo. Temos informações que hoje em torno de 64 mil famílias estão ameaçadas de despejo no Brasil.”

A Recomendação 90 indica que, enquanto permanecer a pandemia, o Judiciário avalie com cuidado os pedidos de desocupações coletivas de imóveis rurais e urbanos, “sobretudo nas hipóteses que envolverem pessoas em estado de vulnerabilidade social e econômica”. A norma sugere a magistrados e magistradas que, nesses casos, deve ser considerado o grau de acesso da população afetada às vacinas ou a tratamentos disponíveis para o enfrentamento da Covid-19.

“Fazemos votos que a recomendação 90 do CNJ, sendo reconhecida pelos magistrados e magistradas do nosso país, torne-se um sinal de que aqueles e aquelas que operam o Direito fazem isso sintonizados na realidade e sensíveis à vida das pessoas, particularmente as mais vulneráveis”, afirma dom Walmor.

Educativo

Em outro efeito prático, a Recomendação 90/2021 pode ajudar 56 famílias ameaçadas de remoção em Duque de Caxias (RJ). Elas ocupam uma área em uma obra inacabada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na Vila Ideal/Favela do Lixão, no município fluminense.

Em março, o Ministério Público Federal (MPF) expediu uma recomendação à prefeitura para que seja apresentada uma proposta para garantir o atendimento a essas famílias. No texto, no âmbito de inquérito que apura atrasos nas obras do PAC na região, o MPF argumenta que deve ser considerada a Lei Estadual 9.020/2020, que impede remoções forçadas durante a pandemia, e a Recomendação 90/2021 do CNJ, que orienta o Judiciário a ter especial cautela em decisões envolvendo despejo coletivo de vulneráveis no atual contexto de crise sanitária.

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