Natação beneficia crianças com autismo
Prevalência da síndrome tem aumentado. Estimativa é de mais de 2 milhões de autistas no Brasil
Já parou para pensar que os benefícios da atividade física ultrapassam, e muito, a fronteira da biologia do corpo humano? Não é de hoje que as vantagens para a mente também são descritas na literatura científica, mas as boas notícias não param por aí. Pesquisas têm mostrado também que os exercícios regulares são excelentes para pessoas com deficiência. "A prática regular da atividade física ajuda a pensar com mais clareza, melhora a memória e proporciona um grande ganho na aprendizagem. A criança aprende brincando”, explica a professora de Educação Física, Viviane Braga.
Especialista também em Psicopedagogia, Viviane começou a dar aulas de natação para crianças autistas no ano passado. “O interessante é que a água é um ambiente prazeroso para os alunos e, através da aula de natação, entre outros ganhos, a criança melhora a postura, alongando e fortalecendo toda a musculatura; aumenta a capacidade respiratória; ativa o sistema neuromuscular e relaxa. Sem contar que é uma forma de proteção para a criança, evitando assim possíveis afogamentos", destaca.
Viviane também lembra que toda a aula é pensada de forma lúdica, com o objetivo de estimular a atenção das crianças, já que a concentração é uma habilidade que precisa ser trabalhada com mais intensidade nas pessoas com autismo. “Materiais de formas e cores diferentes, letras do alfabeto, números em E.V.A, músicas e outros recursos são utilizados para auxiliar o aprendizado da criança, considerando que cada uma é única e se sente estimulada de forma distinta. Devemos atuar em harmonia com a fase de aprendizagem que a criança está vivendo”.
ESTUDOS – Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), e publicada na Revista da Associação Brasileira de Atividade Motora Adaptada em 2014, concluiu justamente o que a professora Viviane percebe na sua rotina de trabalho.
"Vejo que as atividades lúdicas no meio aquático são benéficas para a criança autista, na parte motora, no sentido da ampliação de seus movimentos. Na parte cognitiva, as vivências motoras trabalhadas favorecem no dia a dia a coordenação e consciência corporal. Na parte afetiva, na formação do vínculo afetivo com o professor, ajudando assim na socialização com os colegas. A natação auxilia na disciplina, estabelece limite e motiva a criança”, complementa Viviane.
O estudo de caso da UFES, conduzido pelos pesquisadores José Francisco Chicon, Maria das Graças Carvalho e Alaynne Silva Fontes, mostrou ainda que “no meio líquido é possível criar situações pedagógicas que tenham as ações lúdicas como cerne para estimular a melhor ambientação da criança nesse espaço, ampliar as interações sociais, o aprendizado dos gestos técnicos, como flutuação, respiração, propulsão, etc., a prática colaborativa e a aceitação das diferenças e diversidades de forma mais significativa para a criança. E ao fazer isso, o professor contribui para a organização socioafetiva e psicomotora da criança, em especial da criança com autismo”.
Viviane Braga lembra ainda que a Lei Brasileira de Inclusão (LBI – Lei 13.146/15) preconiza que “a prática da Educação Física e do desporto é um direito fundamental de todos”. “Não devemos esquecer que o esporte socializa e rompe barreiras que pareciam antes intransponíveis”, acrescenta a professora. “E o aprendizado é sempre duplo: eu ensino e aprendo com elas; são as crianças que me ensinam como eu devo ensinar a elas”.
NÚMEROS – O autismo é um transtorno do desenvolvimento cuja prevalência tem aumentado muito nos últimos anos. A pesquisa mais recente do CDC (Center of Diseases Control and Prevention) – órgão norte-americano próximo do que representa, no Brasil, o Ministério da Saúde – mostrou que, nos Estados Unidos, há um autista para cada grupo de 45 pessoas. Os dados foram divulgados em 2015. Em 2014, o mesmo órgão, embora com metodologia diferente, publicou um estudo com a proporção de 1 a cada 68. As estimativas já apontam para 70 milhões de pessoas com autismo no mundo; dois milhões somente no Brasil.
Popularmente conhecido como autismo, o Transtorno do Espectro Autista é uma condição do neurodesenvolvimento, caracterizada por déficits na comunicação e interação social e também por comportamentos repetitivos e estereotipados. Antes dos três anos de vida já podem ser observados alguns sinais, como alterações no sono, aversão ao contato físico, dificuldade de olhar nos olhos, não responder quando chamado pelo nome, não imitar gestos (como bater palmas, acenar ao se despedir), dificuldade de interação com crianças, entre outros. Se desconfiados, os pais devem relatar suas dúvidas ao pediatra.